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Corrupção na arbitragem da Paraíba? “Áudio-bomba” vira caso de polícia

Após áudio atribuído a ex-jogador do Botafogo-PB falar em corrupção envolvendo a arbitragem da PB, Belo vai à Polícia Civil, e Auto cobra que FPF instaure investigação.

Por Priscila Belmont

23/03/2017 às 16h06

Botafogo-PB x Auto Esporte em 2015: o jogo citado no áudio como tendo sido comprado pelo Alvinegro (Foto: Cadu Vieira / GloboEsporte.com/pb)

Quanto tempo é necessário para colocar em xeque toda a credibilidade da arbitragem da Paraíba? Dez anos? Cinco anos? Uma temporada inteira? Que nada! Um áudio de apenas 1min29s, gravado aparentemente via WhatsApp e sem paternidade assumida, está provando que tudo pode ruir bem mais rápido do que se parece a princípio. E é exatamente isto o que está acontecendo ao longo desta semana, num momento em que a primeira fase do Campeonato Paraibano de 2017 se encaminha para a sua reta final.

O caso é aparentemente simples. Mas ao mesmo tempo devastador. Um áudio atribuído ao zagueiro Walter (atualmente no Rio Claro, mas que jogou no Botafogo-PB em 2015) detalha o que parece ser um esquema de compra de árbitros que seria orquestrado por dirigentes do Belo. O arquivo de áudio se tornou público na segunda-feira e rapidamente se espalhou. Chegou à torcida, à imprensa e aos dirigentes. Que começaram a se mobilizar, seja para se defender (no caso do Botafogo), seja para atacar o rival (no caso do Auto Esporte, citado no áudio como um dos clubes prejudicados).

E neste turbilhão em que se transformaram os bastidores do futebol paraibano, o caso chegou à polícia. À Federação Paraibana de Futebol. À Comissão de Arbitragem da Paraíba.

É importante dizer que o próprio Walter, dois dias depois do primeiro áudio aparecer, gravou um segundo áudio (ouça ambos ao lado). E este foi oficialmente divulgado pela FPF, que tenta apaziguar os ânimos e minimizar os efeitos das acusações. Neste segundo áudio, um Walter que está claramente desconfortável e lendo um texto desmente ser ele o autor das acusações.

– Boa tarde, aqui quem está falando é o Walter. Sobre o áudio que tem circulado no WhatsApp, venho a esclarecer que encaminhei para os meus advogados e para o jurídico do Sindicato dos Atletas para que tomem as devidas providências. Uma vez que não falei nem muito menos acusei ninguém. Trata-se de uma gravação clandestina, uma montagem. Tenho muito respeito pelo Botafogo da Paraíba, onde joguei. Nunca presenciei ato que desabonasse arbitragem, muito menos meu ex-clube. Acredito ser uma perseguição para me desestabilizar e manchar minha impecável carreira, tendo em vista que no início de abril tenho uma audiência trabalhista na Paraíba.
Não funcionou. Ou, ao menos, não foi suficiente para encerrar o debate e as trocas de acusações que prosseguem entre dirigentes, que prometem ir até o fim em busca de respostas. Belo e Auto já disseram que vão exigir apurações do caso, ainda que para motivos diferentes.

A ACUSAÇÃO

Como dito, não se tem como afirmar categoricamente que se trata mesmo do zagueiro Walter no áudio que iniciou toda a polêmica. Mas as palavras são duras. E mexeram com as partes citadas.

O contexto do áudio (seja ele verídico ou não) é facilmente identificável. Trata-se de uma pessoa respondendo a um amigo (o nome deste amigo é citado no início da fala, mas o nome é de difícil entendimento) sobre se vale a pena jogar futebol profissionalmente na Paraíba. A resposta, atribuída ao zagueiro, é violenta. E grave:

– Já joguei lá, mano. O Breno paga os caras. Juiz… paga tudo, mano, para ganhar. É a maior várzea, mano. E os caras se vendem lá mesmo, mano. Dá 50 mil pros caras. E os caras se vendem tudo lá. Maior zica – fala-se numa parte do áudio.

Depois, num trecho mais emblemático, que resume bem o rumo da conversa, ouve-se:

– Ali nem adianta. Esquema do caralho nesta Paraíba, mano. Roubam na cara de pau.
A última parte do áudio é a que seria mais esclarecedora. A que a pessoa descreve como seria o esquema:

– Sabe como eles faziam? Ele chegava no vestiário. Chegava no atacante: “Já está tudo certo. Chegar na área, dá o tapa e cai, que ele vai dar o pênalti”. Eu ficava olhando e pensava: “mentira, não precisa”. E tipo assim, contra time pequeno. Não precisa. O Botafogo ia ganhar, se o jogo fosse normal. Aí teve um último jogo que a gente foi vice-campeão. A gente precisava ganhar para ficar com a vaga na Copa do Brasil e na Copa do Nordeste. Aí ele chegou: “O juiz já está comprado. É só a gente fazer o que tem que fazer certo. Já está tudo pago. Na dúvida, vai dar para a gente. Se estiver na dúvida para dar pros caras, vai dar pra gente também. Falei: “Não precisa”. A gente ganhou o jogo sem o juiz dar pênalti nem nada. Até fiz gol neste jogo. A gente ganhou de 4 a 0 do Auto Esporte. E mesmo assim já estava comprado. Ali é foda. É muito sujo. Os caras são safados demais.

A REAÇÃO DO BOTAFOGO-PB

Não tardou. E Botafogo-PB e Auto Esporte reagiram. Arquirrivais, protagonistas do clássico Botauto, de João Pessoa, agora se vêm numa disputa fora de campo.

No Belo, quem falou foi Breno Morais, atualmente diretor de futebol do clube e que em 2015 era o vice-presidente botafoguense. É ele o “Breno” a quem se refere o tal áudio, ainda que seja sempre importante relembrar que este não tenha paternidade assumida.

Breno disse que o clube já foi à Central de Polícia da Paraíba, em João Pessoa, e solicitou uma perícia do Instituto de Polícia Científica sobre a autoria do áudio. Mas ao mesmo tempo se diz tranquilo da lisura do Botafogo:

– Ou o áudio é do jogador ou é montado. A polícia técnica vai dizer. Caso o áudio seja uma montagem como o próprio jogador já falou em outro audio, nós vamos por via judicial atrás do IP do aparelho que produziu. Mas vamos até o fim com essa história – destacou Breno, deixando claro em seguida que é o advogado do clube quem está cuidando de tudo isto.

O advogado, no caso, é Alexandre Cavalcanti, diretor jurídico do Belo. Ele também conversou com a reportagem e deu informações mais técnicas sobre o que pretende o Botafogo indo à polícia.

– O laudo do Instituto de Polícia Científica vai nos dizer se é a voz do atleta que se ouve no áudio e se no arquivo existe algum tipo de montagem ou corte indevido. Caso o laudo seja conclusivo pela veracidade do áudio, nós vamos tomar as medidas cabíveis nas esferas penal, cível e desportiva. Neste caso ele vai ter que provar o que disse. Agora, se o áudio for falso, não teria muito mais o que fazer. Mas ao menos esclareceríamos a verdade – explicou.

Alexandre explica que o IPC deve comparar a voz que está no áudio com a voz do jogador em entrevistas realizadas na época em que ele jogava no clube. Mas, caso esta comparação não seja conclusiva, o atleta pode inclusive ser intimado a prestar um depoimento, em que sua voz seria gravada para dar continuidade à perícia.

A REAÇÃO DO AUTO ESPORTE

Em um tom bem mais duro, está Watteau Rodrigues, presidente do Auto Esporte. Ele disse, inclusive, que já pediu ao presidente da Federação Paraibana de Futebol, Amadeu Rodrigues, para que ele instaure um processo de investigação para apurar o caso. Disse, inclusive, que vai continuar pressionando a FPF para que leve isto adiante. E chegou a ameaçar transferir o Auto Esporte para outro estado caso nada seja feito.

Para ele, existem evidências claras de que o áudio e as irregularidades sejam reais:

– Há fortes indícios de que a denúncia seja verdadeira. Se relembrarmos aquele jogo (no caso, pelas características descritas no áudio, é fácil concluir que se trata do Botauto de 13 de junho de 2015, válido pela última rodada do Quadrangular Final do Campeonato Paraibano daquele ano), aconteceu exatamente o que Walter relatou. O árbitro marcou dois pênaltis contra a gente, em lances parecidos ao descrito no áudio. Na época a gente estranhou muito. O fato é que a gente não tinha provas. Agora tem. Falando em valores. Falando em nome de dirigentes – disparou.

O áudio atribuído a Walter possui algumas distorções e algumas semelhanças. O jogo, por exemplo, não foi 4 a 0, mas 3 a 1. O zagueiro de fato faz um dos gols do Belo. E dois pênaltis são marcados a favor do Alvinegro pelo árbitro João Bosco Sátiro. Um foi marcado ainda no primeiro tempo, quando o meia Doda caiu na área. Neste primeiro lance, o goleiro Vladimir defendeu chute de Rafael Oliveira. No segundo pênalti, o árbitro marca mão de Filipe Ramon dentro da área, gerando muitas reclamações dos atletas automobilistas. Desta vez, Rafael Oliveira converteu.

Para Watteau, algumas providências precisam ser tomadas:

– A primeira providência é investigar a veracidade do áudio. Depois, saber por que ele grava o segundo áudio. Temos que saber se ele sofreu algum tipo de pressão. Mas para mim, me parece que os dois áudios são da mesma pessoa. As vozes são muito parecidas. De forma que tem que haver uma apuração.

Por fim, o presidente automobilista arremata:

– Não acho que Walter seja o investigado. Ele tem que ser convocado como testemunha. Ele precisa esclarecer o que aconteceu. E que o dirigente do Botafogo também tenha a oportunidade de se defender dentro do processo legal. O que não podemos fazer é fingir que nada aconteceu.

A reportagem tentou contato com o presidente da Federação Paraibana de Futebol, Amadeu Rodrigues; e com o árbitro João Bosco, mas não obteve respostas.

Globo Esporte PB

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